Wednesday, September 23, 2015

Lemingues

Dois mil e quinze. Calor tropical. Setembro do ano da cabra.
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Os dias se passam. As pessoas andam apressadas. Cheias de afazeres. Cheias de nada. O medo do não fazer, se assoma ao medo do silêncio, do não ter o que falar. Enquanto isso alguns se lançam em busca de religião-porque-o-fim-está-próximo; outros em torno de causas – porque sempre há alguém sendo violado, quer moralmente, quer fisicamente; outros aos vícios; enquanto outros simplesmente vagueiam, perdidos, embebidos no vazio nulificante do mundo do trabalho maquinal, ou em busca de um trabalho que cale as mentes e as obrigue a se reconfortar com o entorno – buscam serem engrenagens no grande esquema das coisas, no grande relógio antes que a meia noite chegue e o grande buraco negro do não-ser tome a todos.
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Tudo e todos os que se detém a pensar um pouco seguem em busca de uma melodia que lhes dê um tom ao terror do sem-propósito com que o momento nos ameaça as vidas: economia quebrada, ou em vias disso, como no pós guerra alemão da década de 40. Corrupção de corações, mais que de bolsos, como na Itália nos tempos áureos máfia – mas que tinham certa graça, pois havia mais respeito pela vida. Venda da moral, enfiada em roupas de baixo, enfiadas embaixo do tapete, da alma, do espírito. Matanças desesperadas que procuram diminuir o número de vidas que podem ser novas ameaças.
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Vagamos em busca de esperança. O que pode nos salvar, defender, redirecionar? Paideia, o principio grego – que parcamente traduzimos por educação – incluía mais do que crianças na escola como imbuimento de instrução; sabia mais que o culto ao corpo como aprimoramento humano; tratava mais que do conhecimento das ciências externas ao homem como principio de localização do individuo no mundo, mas fazia com que olhasse para dentro de si e se enxergasse indivíduo, cidadão.
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Bem, claro é que uma leva de seres falantes exclusivamente de outros idiomas era tratada como animais, sem direito a dignidade ou a uma pátria ou, mesmo, a terra sobre seus corpos finitos quando era chegada a hora, condenados a quê? Vaguear perdidos entre o submundo e a vida. Espere! Este se parece um pouco com o cenário pintado ali acima: homens que vivem como animais, procurando a quem servir. Isso é uma repetição ou meramente o destino de todos nós nesse século em que parece que a des-humanização, a coisificação, a f-utilização imperam senhoras? Seremos escravos apátridas ou nossa mente se dará o trabalho de aprender que a vida da língua também pode ser vida pro corpo? Ou vamos nos encerrar em nossos cubículos de saber cada vez mais sobre coisa mais ínfima e nos celebrizar por mais esse vazio?

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Canso de procurar a quem servir. Estou agora procurando quem dê a mão e siga pra dançar nessa roda, dialogando sobre os caminhos antes que a maquinal roda-viva do vazio coletivo consuma ou lance no vazio o que sobra dessa resistência renitente em teimar.
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A quem se se habilitar, uma pergunta: pode dar o tom para essa música antes que o flautista sombrio nos conduza ao mar?

Monday, November 11, 2013

Aos meus parcos e diletos leitores aqui vai uma beleza diferente e inspirada. Muito mais afável do que o que posto (posto?) corriqueiramente neste hemi-vivo blog.

É o texto de uma querida amiga, Clarice. Mocinha particular, mas não tolhida por isso e, assim, criativa e muito valente. Bem, a ela, ou a parte dela.


78% de Vida

Sempre achei essas falas comuns a um início da conversa muito engraçadas. O famoso “Como está a sua vida?”. A partir daí espera-se que a pessoa diga que está bem e forneça um panorama das áreas: trabalho, relacionamento, projetos, família. E assim, a partir das atualizações a conversa se aprofunda ou se esvai entre algumas respostas vazias, as caras ligeiramente constrangidas e um rápido “Preciso ir agora”.

Desde a infância que mantenho uma amizade consistente com Ricardo e era comum de tempos em tempos procurarmos um ao outro para conversar. Passaram-se 70 anos e me orgulho em dizer que a proximidade sempre permitiu que fôssemos sinceros um com o outro, sem deixar o assunto ser encerrado em um simples “Estou bem”.

As respostas de Ricardo eram abertas, mas havia um padrão em todas elas. Algo refletido pela sua vida e seu comportamento. Ele sempre dizia algo como: “Ta muito boa, mas ainda não está 100%”, ou “Tirando isso está tudo bem”, ou “Eu preciso resolver aquele pepino e acredito que depois disso vai estar tranquilo”.

Aos 16 anos Ricardo queria uma namorada e ansiava todos os dias pelo momento em que poderia dirigir pela primeira vez. Ele se ocupava constantemente por esses pensamentos. Aos 21 ele queria casar e comprar sua primeira casa. Aos 30 ocupava-se planejando o futuro dos filhos. 
Desta mesma forma correram os demais anos de sua vida.

Não eram os planos para o futuro que me intrigavam, mas a forma como ele parecia ocupar cada minuto de sua vida. Ele despendia toda a sua energia em algo que ainda estava para acontecer e que a realização muitas vezes não estava em suas mãos. Pelo menos não naquele momento.

Quando saíamos com os amigos, Ricardo estava sempre compenetrado. Lembro-me que ele retirava um caderno pequeno, vermelho e surrado do bolso. Ao recordar algo, Ricardo fazia questão de escrever e adicionar mais uma à sua imensa lista de tarefas.

Hoje posso dizer, a lista era também interminável. Sempre há algo a ser feito. A cada mês contas novas chegam, o carro que acabou de passar por uma revisão precisa ser lavado. O filho que recentemente passou por uma dificuldade na escola, tem uma consulta com o médico. E da mesma forma, somos constantemente tomados por surpresas positivas: uma festa de formatura, um casamento, uma conquista profissional, uma surpresa de alguém querido.
Esses afazeres são comuns a todos nós, mas Ricardo, no entanto, parecia sempre ansioso, buscando por algo. 
Ele não estava presente, parecia incompleto.

No início eu entendia, éramos adolescentes e havia certa ansiedade em amadurecer, estabelecer-se financeiramente, profissionalmente. Construir uma carreira, ganhar o próprio dinheiro. Conhecer alguém com quem compartilhar tudo isso.

Chegamos a conversar algumas vezes. Tentei lhe dizer que havia algo de encantador e único em cada dia da vida e que não se tratava de uma corrida de obstáculos.
Viver é um passeio de barco. Caminhamos rumo a chegada, mas o prazer está na vista.
Acredito que Ricardo nunca entendeu.

Um dia morreu. Preocupado com a conta de luz em cima da mesa.
http://coisasmalucasdeclarice.blogspot.com.br/2013/06/78-de-vida.html

Esse que me inspirou tanto que lhe fiz uma réplica [técnico que sou] poética [curioso que sou]. Pode ser lida tanto  quanto cá:
É que Ricardo nunca bebeu da fonte da juventude das palavras. Esse er ao seu problema. Ele se perdia com os números: números a pagar, números a conquistar, classes de números de que não participar, níveis de status a que chegar. E muitas pessoas se perdem entre os números. É verdade. Números são labirintos. O que acha que havia no labirinto que assustou tanto ao pai de Icaro a ponto de fazê-lo pensar em tentar o impensado?


O quê? Não foi o pai de Icaro? Acha que sabe de toda a história não é?Mas não sabes que ele ouviu a história e como gente que sente, gente que sabe onde está o outro e como é estar no lugar do outro se assustou. Porque estava sentido os números dentro do labirinto, os números que eram contra Teseu. E os números que logo seriam contra si. E intentou um salto "indo onde nenhum homem jamais esteve" mais alto do que sua altura. E conseguiu... Mas porque se prendeu às palavras. As dos pássaros mediterrâneos descreviam o maravilhoso ar que circula na altura cujo nome não é um número, mas um nome propriamente: o nome elísio de respirar da flama solar arrefecida pelo frescor do sonho.

Isso Ricardo, sincero e límpido, mas perdido com seus números não pôde, não poderia nunca ver.

Felizmente você ainda goza de engenhosidade e pode contar isso aos primos dos filhos de Ricardo. Pois tudo o que ele gerou foi um número com um nome também assustador chamado estatística.

Você pode, entretanto, entrar comigo nessa outra casa com um nome muito mais bonito. Você quer? Ah, sim, o nome? Poesia.

Thursday, December 08, 2011

Gastronomia Japonesa: Autoindulgência? Prazer!




Comida japonesa é tudo de bom! Mas você conhece todos os ingredientes e iguarias da deliciosa culinária oriental? O Amadeus te ajuda a decorar os nomes dos principais pratos. Veja aí: 
Sushi: É o mais famoso prato japonês no mundo. E o mais popular entre os japoneses, que o prepara em ocasiões especiais. Basicamente, o sushi pode ser definido como um bolinho de arroz coberto por peixes ou frutos do mar crus. Há, no entanto, vários tipos de sushis, que mudam de nome conforme a forma de preparo ou os ingredientes utilizados. Confira os tipos mais conhecidos:
Niguiri: Pequenos bocados de arroz recobertos com fatias de peixes ou frutos do mar crus, sendo os mais comuns os de atum, camarão, enguia, lula, polvo, salmão e omelete;
Gunkan: Arroz enrolado por algas marinhas e recheado com peixe cru, frutos do mar, ovas de peixes ou legumes;
Uramaki: É um sushi às avessas. Neste tipo, o arroz recobre as algas, que, por sua vez, são recheadas com vários tipos de peixes, legumes e até frutas. No Brasil, a manga é utilizada na confecção deste tipo de sushi;
Temaki: Cones de algas recheados com arroz, peixe cru ou frutos do mar e legumes;
Chirashi: peixes, frutos do mar e legumes espalhados por sobre o arroz de sushi.
Sashimi: Fatias de peixe cru degustadas com shoyu (molho de soja) e wasabi (raiz forte). Os japoneses comem alguns diferentes tipos de peixes crus. É óbvio que o peixe tem de estar o mais fresco possível.
Os mais populares tipos de sashimi são:
Maguro:atum;
Toro: atum gordo (parte nobre);
Ika: lula;
Tako: polvo;
Ebi: camarão;
Saba: cavalinha (espécie de peixe);
Sake: salmão.
Como comer: Ponha um pouco de shoyu em um pequeno prato. A maneira correta de embeber o niguiri sushi é virá-lo de cabeça para baixo, com a parte do peixe cru para baixo. Poucos tipos de niguiri sushi devem ser comidos sem o shoyu. No geral, você deve comer o sushi de uma vez, enfiando-o todo na boca. Você pode utilizar as mãos ou os hashis para pegar os sushis.
Como comer grandes pedaços de comida: Ponha um pouco de shoyu em um pequeno prato e acrescente um pouco de wasabi (raiz forte), misturando-os em seguida. Embeba as fatias de peixe ou de frutos do mar crus na mistura e coma de uma só vez. Alguns tipos de sashimi são comidos com gengibre ralado em vez de wasabi.
Tempura: Frutos do mar e vegetais empanados e fritos em óleo fervente. Foi introduzido no Japão pelos portugueses. Hoje em dia, tornou-se um dos pratos mais populares do Japão, e também bem conhecido no mundo todo.
Algas:
As algas (kaiso) são uma importante parte da dieta japonesa, por ser muito rica em minerais. Várias espécies de algas são comidas de diferentes maneiras.
As três mais conhecidas são:
Nori: É a mais comum. São lâminas secas e finas de algas usadas nos “rolinhos” e em outros tipos de sushi. Pode ser usada como condimento ou acompanhamento para o arroz;
Wakame: É comumente usada em sopas como a de misô ou em alguns tipos de saladas. Hoje em dia, wakame é vendida na forma seca, mas ela se expande quando a põe na água;
Kombu: É usada como ingrediente básico de sopas.
Wasabi: É um dos principais temperos da culinária japonesa. Feito de raiz forte, costuma ser utilizado em forma de uma pasta como condimento em sashimis e sushis. De qualquer forma, wasabi é também muito usado em outros pratos japoneses.
Saquê: É feito de arroz e água. Há vários tipos regionais de saquê. Sua graduação alcoólica varia entre 10 e 15% e pode ser servido quente ou gelado. Costumam ser servidos em pequenos potes ou em um recipiente chamado masu. Atualmente, alguns já são vendidos em embalagens tetra packs (de papelão reciclável).
Umeshu: lícor de ameixa.
Shochu: É um tipo de aguardente. Pode ser feita de cereais e de batata doce. É bem mais forte do que o saquê.
O chá: É uma das bebidas mais populares do Japão. O chá verde é bebido em qualquer lugar e em qualquer ocasião. Diferentemente do chá inglês, o chá verde é servido em canecas sem a asa e nunca é bebido com açúcar ou creme. A maneira correta de beber chá verde é segurar a caneca com uma mão e apoiá-la embaixo com a outra mão. Há vários tipos:
Gyokuro, sencha, bancha: O chá verde mais comum feito de folhas secas de chá, que apresentam três níveis de qualidade;
Houjicha: Chá verde feito das folhas torradas do chá, que lhe dá uma coloração marrom;
Matcha: É usado na Cerimônia do Chá e tem o sabor mais amargo. É feito das folhas de chá moídas;
Chá chinês: São chás aromáticos, como o “oolong” e o de jasmim, etc.;
Kocha: É o nome do chá preto.
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/comida/ult10005u385926

Tuesday, January 11, 2011

PresidentE ou PresidentA: Um palpite da sociolinguística




Em resposta a uma pergunta de uma colega de tradução, Mirna Soares, dona do blog Translation News , postada num grupo do yahoo de tradutores escrevi esta resposta, que aqui publico sem pretensas de grande discurso [Apesar de ter me passado pela idéia algo como "Dez letrinhas e um destino" ou "Easy Writer" - idéia logo abandonada devido à falta de cara-de-pau e certo apelo do amigo SuperEgo], mas porque a pertinência me soou útil também a outros olhos e mentes.

Enfim, a pergunta era:

Aqui na OEA estamos usando A presidentE. Nos jornais tenho visto tanto
presidenta como presidente.
Vocês acham que presidente é uma palavra marcada por gênero?

Sinceramente, a marcação de gênero é, ou pode ser considerada marcada, por pura
e simples marcação conceitual [apesar da marca de gênero] - palavra de linguista
com inclinações sociológicas, nesse papo.

Explico: não acredito que seja/fosse pra destacar que a mulher é - por ser do
gênero feminino - melhor, mas para apregoar, assinalar (e ojerizar) a aos quatro
ventos, mais ou menos com a mesma idéia do americano 'Yes, we can', tão
conhecido. Como quem diz "O nunca-antes-nesse país aconteceu!"

Muito embora por aspectos linguísticos próprios da língua inglesa o gênero não
seja visível [até porque o 'we' aponta para uma coletividade, que por convenção
é masculina] esse pronome poderia ser apontado como destacando uma coletividade
étnica espefícica, se interpretarmos sociologicamente.

Entretanto, não se fez isso (que eu saiba) baseado nas palaras do Obama, mas
baseado na, até porque óbvia, representação étnica que ele fazia, na assunção da
presidência.

Já no caso do Brasil, a coisa caiu pra língua, bem entendida como uma língua que
destaca gêneros... E é aí que a cobra morde o rabo, e tudo se inclina ao ciclo
infinito de daquela velha tirada propagandística da bolacha: "vende mais porque
está sempre fresquinha, ou está sempre fresquinha porque vende mais?"

Posto aqui, abrindo a discussão da minha opinião postada aos que não são tradutores por profissão, mas que também têm opinião.

Portanto, façam suas apostas, digo, res-postas.

Thursday, January 06, 2011

Escritores e Cozinheiros



Citando alguém muito bom para se (re)começar o ato da escrita: Rubem Alves em seu texto delicioso de nome citado acima, no livro Retorno (E)Terno:

"Tenho um sonho que, acho, nunca realizarei: gostaria de ter um restaurante. Mais precisamente: gostaria de ser um cozinheiro. As cozinhas são lugares que me fascinam, mágicos: ali se prepara o prazer. Mas para preparar o prazer, o cozinheiro deve ser psicólogo, um adivinho de desejos, conhecedor dos segredos da alma e do corpo. Mas não sei cozinhar. Acho que é por isso que escrevo. Escrevo como quem cozinha. Minha cabeça é uma cozinha. O cozinheiro cozinha pensando no prazer que sua arte irá causar naquele que come. Eu escrevo pensando no prazer que o meu texto poderá produzir naquele que me lê.

A relação entre cozinhar e escrever tem sido frequentemente reconhecida pelos escritores. É a própria etimologia que revela a origem comum de cozinheiros e escritores. Nas suas origens, sabor e saber são a mesma coisa. O verbo latino sapare significa, a um tempo, tanto saber quanto ter sabor. Os mais velhos haverão de se lembrar que, num português que não se fala mais, usava-se dizer de uma comida que ela sabia bem. Saber e experimentar o gosto das coisas: comê-las. O sábio é aquele que conhece não só com os olhos, mas especialmente com a boca. Quem conhece só com os olhos conhece de longe, pois a visão exige distância; muito de perto a gente não vê nada. Quem conhece com a boca conhece de perto, pois só se pode senti gosto daquilo que já está dentro do corpo.

Suspeito que Roland Barthes também tivesse uma secreta inveja dos cozinheiros. Se assim não fosse, como explicar a espantosa revelação com que termina um dos seus mais belos textos, a lição? Confessa que havia chegado para ele o momento do esquecimento de todos os saberes sedimentados pela tradição e que agora o que lhe interessava era "o máximo possível de sabor''. Ele queria escrever como quem cozinha - tomava os cozinheiros como seus mestres. Ele queria ler como quem come uma comida deliciosa.

Mário Quintana também diz do seu sonho de produzir com a escrita, uma coisa que fosse boa de ser comida e trouxesse deleite ao corpo.
Eu sonho com um poema
Cujas palavras sumarentas escorram
Como a polpa de um fruto maduro em tua boca,
Um poema que te mate de amor
Antes mesmo que tu lhe saibas o misterioso sentido:
Basta provares o seu gosto...

A ideia de comer me sugere uma associação deliciosa. Pois comer não se aplica só ao que acontece a mesa. Comer se usa também para descrever o que acontece na cama. Comer e fazer amor. O cozinheiro e o amante são movidos pelo mesmo desejo: o prazer do outro. A diferença está em que o amante oferece o seu próprio corpo para ser comido, como objeto de deleite. O escritor, à semelhança dos amantes, também oferece o seu corpo ao outro, como objeto de prazer. Só que sob a forma de palavra. Cada escritura é uma celebração eucarística: Tomai, comei, isto e o meu corpo...

A leitura tem de ser uma experiência de felicidade. Desejo o prazer do meu leitor. E cada leitor, como o sugeriu Barthes, impõe ao escritor uma condição para seu prazer: "O texto que o senhor escreve tem de me dar prova de que ele me deseja.'' É preciso que as palavras façam amor, como o sugeriu Andre Breton. Por isso que Borges aconselhou aos seus estudantes que eles só deveriam ler os textos que lhes dessem prazer: "Se os textos lhes agradam, ótimo. Caso contrário, não continuem, pois a leitura obrigatória é uma coisa tão absurda quanto a felicidade obrigatória.'' Não se pode comer por obrigação. Não se faz amor por obrigação. Não se pode ler por obrigação.

É este o secreto desejo de cada escritor: o prazer do leitor.
Enquanto viajava liguei o rádio do meu carro e ouvi o anúncio de um curso de leitura dinâmica: a leitura sob o domínio da velocidade. Esta é a última coisa que um escritor pode desejar. Pois o prazer exige tempo. Quem está no prazer não deseja que ele chegue ao fim. Comer depressa, para acabar logo? Fazer amor depressa, para acabar logo? O prazer é preguiçoso. Arrasta-se. Demora. Deseja parar para começar de novo. E depois de terminado, espera pela repetição.
Esta é a razão por que eu gostaria de ser cozinheiro. É mais fácil criar felicidade pela comida que pela palavra... Os pratos de sua especialidade, o cozinheiro os sabe de cor. Já foram testados, provados, gozados. Basta repetir, fazer de novo o que já foi feito. Mas é justamente isto que está proibido ao escritor. O escritor é um cozinheiro que a cada semana tem de inventar um prato novo. Cada semana que começa é uma angústia, representada pelo vazio de três folhas de papel em branco que me comandam: "Escreva aqui uma coisa nova que dê prazer!'' Escrever é um sofrimento. Todo texto prazeroso conta uma mentira. Ele esconde as dores da gestação e do parto. De vez em quando alguém me diz: "Como você escreve fácil!'' Fico feliz. Alguém me confessou o seu prazer no meu texto. Mas sei que esta facilidade só existe para quem lê. O fogo que me queimou ficou na cozinha. Mário Quintana diz que é preciso escrever muitas vezes para que se dê a impressão de que o texto foi escrito pela primeira vez. Sim, para que se dê a impressão... Porque se o sofrimento do escritor aparece, o seu texto terá o gosto de comida queimada.

Por isso que, a cada semana, sinto uma enorme tentação de parar de escrever. Para sofrer menos. Escrever é um cozinhar em que o cozinheiro se queima sempre.
Mas vale a pena ficar queimado pela alegria no rosto de quem come a comida que se fez."

E se basta

Tuesday, March 10, 2009

Seguindo a linha CICERONE...


Seguindo a linha CICERONE... ao contrário do que algumas ilustres pessoas pensam que é só mais uma da minha veia (a cinematográfica no caso emquestão)... Aqui vai mais um minuto de cultura inútil.
[Aos interessados em cultura REALMENTE útil, posso inserí-la sob solicitação.]

É que gosto de ensinar coisas...desde que a interessados...assim, Atrê (do www.conversaatrevida.blogspot.com) já dizia que é sexy quem ensina, acho que sou sexy há - pelo menos - 6 anos e não sabia. (risos)

Bem, de lado as chorumelas e direto ao ponto (hmm...) falemos do dia 1º de April, April Fool's, Poisson d'Avril, no Brasil, países falantes de língua inglesa e França, respectivamente.

Além das muitas possíveis explicações mencionadas a tida com maior grau de certeza é a de que, segundo minhas fontes historiadoras (algo com que a wikipedia curiosamente concorda) no ano de 1564, depois da adoção do calendário gregoriano, o rei Carlos IX de França determinou que o ano novo seria comemorado no dia 1 de janeiro. Alguns franceses resistiram à mudança e continuaram a seguir o calendário antigo - chamado Juliano -, pelo qual o ano iniciaria em 1 de abril.

Gozadores passaram então a ridicularizá-los, a enviar presentes esquisitos e convites para festas que não existiam. Essas brincadeiras ficaram conhecidas como plaisanteries.

No século XVIII a 'festividade' era apontada como datando desde Noé.
Certo artigo de jornal inglês publicado em 13 de abril de 1789 explicava que o dia teve suas origens com o envio muito adiantado do corvo, por Noé, antes das águas baixarem (aquelas do dilúvio, lembram?).

Ele teria feito isso no primeiro dia do mês hebreu que corresponde a abril.

Outra referência possivel ao primeiro de abril pode ser vista nos Contos de Canterbury (de 1400), particularmente no Conto chamado "o conto da Freira do Clérigo (tradução aproximada de 'Nun's Priest's tale'), um conto de dois tolos: Chantecler e a raposa, que teria ocorrido em 32 de março.

Wednesday, March 04, 2009

Beleza Roubada - 123 minutos de busca contra a dor transformada em lirismo.



Tudo bem, meu post dessa vez - como se fosse a única - é uma menção do post de uma outra mocinha escritora Mariana Warth. Mas só e somente cito porque concordo palavra com palavra com o que ela infomra sob re o filme. Exceto, é claro, quando chama a trilha de adolescente


"O filme é lindo. A trilha, adolescente. Um misto de jazz, soul, alternativo, folk. É como o filme: uma jovem que descobre o mundo atraves das sensações de infância, novas experiências, passeios no campo e cheiro de mato. Liv Tyler faz o papel de uma menina de cidade grande que vai passar as férias no interior da Itália. Dá-se a história.

Em qual trilha poderia se misturar Portishead, Hoover e Liz Phair com Billie Holiday, Nina Simone e Stevie Wonder? Ainda, os progressivos Cocteau Twins?! Me parece que a menina da cidade grande leva as novas tendências para o interior mas também aprende a ouvir o antigo. O filme mostra isso claramente. A personagem passa grande parte do tempo ouvindo música, o que trouxe de casa. E o velho tio parece lhe sugerir o que deve ser interessante... e muito mais...

Não posso contar muito sobre o filme - mas que também não tem nada demais, é apenas um belo filme de Betolucci, com lindas locações, imagens de sonho, para que todos queiram se mudar para o interior tranquilo de qualquer país pacífico mesmo da nossa imaginação. É aquele lugar do nosso desejo. A gravação de Billie Holiday de "I´ll be seeing you" tem aquele som de rádio velho, vitrola com ruído, exatamente todos os barulhos imperfeitos que escutamos quando em paz, nesse lugar idílico.

Uma pena é que a trilha não conte com nenhuma gravação italiana. Claro, não esperava nenhuma tarantella ao ouvir a trilha, muito menos ao ver o filme. Mas talvez a questão da tradição familiar imbutida no filme pudesse ser traduzida por alguma canção do gênero. Mas não faz mal. Creio que a trilha de Beleza roubada seja irretocável, para todos os gostos. Uma delícia de ouvir."

Graças ao nosso amigão ta vizinhança - não, não é o Homem-Aranha, é o Youtube.com temos aqui uma palhinha da coisa de arte: Trailer - Stealing Beauty - Beleza Roubada (1996)

Resista você. Seja diferente. Tente não ver e não querer ter também esta Beleza Roubada.

Em cena dois links de críticas bacanas com:
Cinema em cena 1.
e
Cinema em Cena 2.